Gente, é como digo, quando me faltam as palavras, sempre acho alguém que as use muito bem por mim ;)
"Tempo, pensamento, libido e energia são
solteiros e morrerão assim, mesmo contra nossa vontade.
O que é, o que é? Faz você ter olhos para
uma única pessoa, faz você não precisar mais ficar sozinho, faz você querer
trocar de sobrenome, faz você querer morar sob o mesmo teto. Errou. Não é
amor.
Todo mundo se pergunta o que é o amor. Há
quem diga que ele nem existe, que é na verdade uma necessidade supérflua criada
por um estupendo planejamento de marketing: desde criança somos condicionados a
eleger um príncipe ou uma princesa e com eles viver até que a morte nos separe.
Assim, a sociedade se organiza, a economia prospera e o mundo não foge do
controle.
O parágrafo anterior responde o primeiro.
Não é amor querer fundir uma vida com outra. Isso se chama associação: duas
pessoas com metas comuns escolhem viver juntas para executar um projeto único,
que quase sempre é o de construir família. Absolutamente legítimo, e o amor pode
estar incluído no pacote. Mas não é isso que define o amor.
Seguramente, o amor existe. Mas, por não
termos vontade ou capacidade para questionar certas convenções estabelecidas,
acreditamos que dar amor a alguém é entregar a essa pessoa nossa vida. Não só
nosso eu tangível, mas entregar também nosso tempo, nosso pensamento, nossas
fantasias, nossa libido, nossa energia: tudo aquilo que não se pode pegar com as
mãos, mas se pode tentar capturar através da possessão.
O amor em estado bruto, o amor 100% puro, o
amor desvinculado das regras sociais é o amor mais absoluto e o que maior
felicidade deveria proporcionar. Não proporciona porque exigimos que ele venha
com certificado de garantia, atestado de bons antecedentes e comprovante de
renda e de residência. Queremos um amor ficha-limpa para que possamos
contratá-lo para um cargo vitalício. Não nos agrada a idéia de um amor solteiro.
Tratamos rapidamente de comprometê-lo, não com o nosso amor, mas com nossas
projeções.
O amor, na essência, necessita de apenas
três aditivos: correspondência, desejo físico e felicidade. Se alguém retribui
seu sentimento, se o sexo é vigoroso e se ambos se sentem felizes na companhia
um do outro, nada mais deveria importar. Por nada, entenda-se: não deveria
importar se outro sente atração por outras pessoas, se outro gosta de fazer
algumas coisas sozinho, se o outro tem preferências diferentes das suas, se o
outro é mais moço ou mais velho, bonito ou feio, se vive em outro país ou no
mesmo apartamento e quantas vezes telefona por dia. Tempo, pensamento, fantasia,
libido e energia são solteiros e morrerão solteiros, mesmo contra nossa vontade.
Não podemos lutar contra a independência das coisas. Aliança de ouro e demais
rituais de matrimônio não nos casam. O amor é e sempre será autônomo.
Fácil de escrever, bonito de imaginar,
porém dificilmente realizável. Não é assim que estruturamos a sociedade. Amor se
captura, se domestica e se guarda em casa. Às vezes forçamos sua estada e quase
sempre entregamos a ele os direitos autorais de nossa existência. Quando o
perdemos, sofremos. Melhor nem pensar na possibilidade de que poderíamos sofrer
menos."
Por Martha Medeiros