quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Os Porques da Vida da Gente


Por que é que a vida não pode ser como nos filmes onde há sempre tempo de voltar atrás e corrigir os erros às custas da força de vontade? Por que é que não podemos ter sempre certezas, e antes viver mergulhados nas nossas dúvidas? Por que é que não nos apaixonamos, tais quais os protagonistas de novela, que logo no 1º capítulo, já tem a certeza de que tudo vai valer a pena, já que no fim tudo acaba bem? Por que é que os desencontros não podem ser somente temporários? Por que é que a cada curva do caminho não há um atalho que nos leve de volta ao ponto de partida? Por que é que nem sempre tudo tem solução? Por que é que temos que errar para aprender, se seria tão mais fácil nascermos já ensinados? Por que é que continuamos a insistir em bater com a cabeça contra a parede, se a primeira tentativa é suficiente para comprovarmos que dói?
Por que é que passamos metade da vida a pensar quando devíamos agir e a outra metade a agir sem pensar duas vezes? Por que é que essa abordagem é tão eficaz para uns e só serve para complicar a vida dos outros? Por que insistir em magoar-nos e prolongar o nosso sofrimento lutando por sonhos impossíveis? Por que é que ao longo do trilho não há simplesmente tabuletas a indicar os becos sem saída que só nos farão perder tempo, e os sentidos obrigatórios onde, cedo ou tarde, iremos cair? Por que não acertar a primeira, mas somente depois de tentar 1001 combinações inúteis que só servem para nos desgastar o espírito, minar a confiança e estilhaçar o coração? Por que é que a pessoa com quem estamos destinados a acabar não surge logo na nossa vida para ficar? Por que temos que nos submeter ao método da tentativa-erro? E, no fundo, por quê tantos porques? Por que esta capacidade, esta necessidade de nos interrogarmos, de nos torturarmos com os “E se”, se no final tudo o que temos são fatos imutáveis contra os quais de nada nos valem os argumentos?

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Caído na Calçada

Ontem saí de casa mais cedo do que o normal, a temperatura era amena de primavera, o dia estava amarelo e azul, do som do meu carro se evolava o rock suave da Rádio Itapema e eu me sentia realmente bem. Estacionei numa rua quase bucólica do Menino Deus e vi que ali perto um catador de papel puxava sua carrocinha sem pressa.
Era magro e alto, devia andar nas franjas dos 50 anos e tinha a pele luzidia de tão negra. Ao seu lado saltitava um menino de, calculei, uns quatro anos de idade, talvez menos. Devia ser o filho dele, porque o observava com um olhar quente de admiração, como se aquele homem fosse o seu herói... Bem. Ao menos foi o que julguei, certeza não podia ter.
Já ia me afastar quando, por entre as grades da cerca de uma creche próxima, voou um brinquedo de plástico. Um desses robôs cheios de luzes e vozes, que se transformam em nave espacial e prédio de apartamentos, adorado pelas crianças de hoje em dia. Algum garoto devia ter atirado o brinquedo para cima por engano, ou fora uma gracinha sem graça de um amigo.
O menino que era dono do brinquedo colou o rosto na grade como se fosse um presidiário, angustiado. O filho do catador de papel correu até a calçada, colheu o robô do chão e não vacilou um segundo: retornou faceiro para junto do pai, o brinquedo na mão, feito um troféu.. Olhei para o menino atrás da cerca. Estranhamente, ele não falou nada, não gritou, nem reclamou. Ficou apenas olhando seu brinquedo se afastar na mão do outro, os olhos muito arregalados, a boca aberta de aflição.

Muito orgulhoso, o filhinho do catador de papéis mostrou o brinquedo ao pai. O pai olhou. E fez parar a carrocinha. Largou-a encostada ao meio-fio. Levou a mão calosa à cabeça do filho. E se agachou até que os olhos de ambos ficassem no mesmo nível.
A essa altura, eu, estacado no canteiro da rua, não conseguia me mover. Queria ver o desfecho da cena. O pai começou a falar com o menino. Falava devagar, com o olhar grave, mas não parecia nervoso. Explicava algo com paciência e seriedade. O menino abaixou a cabeça, envergonhado, e o pai ergueu-lhe o queixo com os nós do dedo indicador. Falou mais uma ou duas frases, até que o filho balançou a cabeça em concordância.
A seguir, o menino saiu correndo em direção à creche. Parou na grade, em frente ao outro garoto. Esticou o braço. E, em silêncio, devolveu-lhe o brinquedo. Voltou correndo para o pai, que lhe enviou um sorriso e levantou a carrocinha outra vez. Seguiram em frente, o pai forcejando, o filho ao lado, agora não saltitante, mas pensativo, concentrado.
Então, tive certeza: aquele olhar com que o menino observara o pai era mesmo de admiração, ele era de fato o seu herói.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Um Pequeno Imprevisto


 Eu quis querer o que o vento não leva
Pra que o vento só levasse o que eu não quero.
Eu quis amar o que o tempo não muda
Pra que quem eu amo não mudasse nunca.

Eu quis prever o futuro, consertar o passado
Calculando os riscos
Bem devagar, ponderado
Perfeitamente equilibrado.

Até que um dia qualquer,
Eu vi que alguma coisa mudara
Trocaram os nomes das ruas
E as pessoas tinham outras caras.
No céu havia nove luas
E nunca mais encontrei minha casa.
No céu havia nove luas
E nunca mais eu encontrei minha casa.

(Theddy Correia - Herbert Vianna)


Meias palavras. Meios sentimentos. Meias para os pés que não esquentam o coração. Mas, um pequeno imprevisto me desvirtua, me desconcerta, me alegra e me desperta.